Por Delfim Ossamu Miyamaru
O valor dos Serviços de Tráfego de Embarcações (Vessel Traffic Services – VTS) na segurança da navegação foi reconhecido pela primeira vez pela Organização Marítima Internacional (OMI) na resolução A.158(ES.IV) – Recommendation on Port Advisory Systems de 1968. Desde então, a OMI adotou as resoluções A.578(14)/1985, A.857 (20)/1997 e A.1158 (32)/2021 para atualizar as Diretrizes para implantação do VTS – Guidelines for Vessel Traffic Services, não se restringindo ao ambiente portuário, mas também se estendendo para a prestação dos serviços na área costeira, como, por exemplo, para a avaliação e proteção do meio ambiente marinho e proteção de instalações offshore.
A resolução A.1158 (32)/2021 atualizou substancialmente as diretrizes para o estabelecimento dos VTS, considerando os desenvolvimentos tecnológico, operacional e organizacional que ocorreram desde 1997. Além disso, reconheceu a Associação Internacional de Autoridades de Auxílios à Navegação Marítima e Faróis (International Association of Marine Aids to Navigation and Lighthouse Authorities – IALA) como agência internacional reguladora de navegação e colaboradora importante da OMI, além de destacar que a referida entidade é responsável pela regulamentação detalhada dos VTS.
A Norma da Autoridade Marítima (NORMAM – 602 de 2023) destaca que os VTS contribuem para salvaguardar vidas no mar, a segurança da navegação, o aumento da eficiência do tráfego marítimo, a prevenção da poluição marinha e a adoção de medidas de emergência antipoluição, além da proteção das comunidades e infraestruturas contíguas à Área VTS.
Já a Convenção Internacional para a Salvaguarda da Vida Humana no Mar (SOLAS) de 1974 não se referiu especificamente aos VTS. Contudo, em 1997, houve a adoção do novo capítulo V sobre Segurança na Navegação, regulando quando os VTS deveriam ser implementados. A revisão, em 2002 da regra 12 do Capítulo V da SOLAS, estabeleceu que os VTS contribuem para a segurança da vida humana no mar, para a segurança e a eficiência da navegação e para a proteção do ambiente marinho, das áreas costeiras adjacentes, dos locais de trabalho e das instalações ao largo (offshore) contra possíveis efeitos adversos do tráfego marítimo.
Outra convenção importante estabelecida no âmbito da OMI é a Convenção Internacional para a Prevenção da Poluição Causada por Navios (International Convention for the Prevention of Pollution from Ships – MARPOL – 1973/1978) que define as regras para a preservação ambiental em ambientes marítimos e costeiros. Os VTS na área costeira são utilizados para atingir os objetivos pretendidos pela MARPOL, mesmo não sendo citado de forma expressa por essa Convenção, haja vista a sua capacidade de monitorar e gerar informações sobre o tráfego marítimo de forma ampla, possibilitando a formulação de soluções para os problemas combatidos pela Convenção.
No Brasil, os Serviços de Tráfego de Embarcações aplicados na área costeira se relacionam com o Sistema de Gerenciamento da Amazônia Azul (SisGAAz), programa previsto no Plano Estratégico da Marinha (PEM) 2040, destinado a monitorar e proteger, continuamente, as Águas Jurisdicionais Brasileiras (AJB) e as áreas internacionais de responsabilidade para operações de Socorro e Salvamento (SAR – Search and Rescue), os recursos marítimos em águas brasileiras, sejam recursos vivos e não vivos, e salvaguardar portos, embarcações e infraestruturas, em face de ameaças, emergências, desastres ambientais, hostilidades ou ilegalidades, a fim de contribuir para a segurança e a defesa da Amazônia Azul e para o desenvolvimento nacional.
Pode-se, portanto, afirmar que o SisGAAz, após o término de todas as etapas, constituirá um sistema-de-sistemas integrando-se aos sistemas de VTS Costeiro espalhados pelo litoral, visando a garantir a segurança da navegação e proteção ambiental e de instalações offshore na zona costeira brasileira.
Cabe ainda ressaltar o estudo sobre os modelos de governança dos portos, realizado por mestrandas da Escola de Guerra Naval, viabilizado por meio de um acordo de cooperação técnica entre a Fundação Ezute e a instituição. O referido estudo alerta para a necessidade de governança dos portos em relação à segurança cibernética, revelando significativas lacunas e desalinhamentos jurídicos no cenário atual. Essas falhas evidenciam uma urgente necessidade de que o poder público aprimore sua visão e abordagem sobre a segurança cibernética nos portos ao formular políticas e legislações. É essencial que sejam desenvolvidas leis mais claras e robustas, com uma terminologia precisa e menos ambígua, para fortalecer a proteção cibernética nos portos e otimizar o gerenciamento de dados de tráfego marítimo. Tal progresso não só aumentaria a eficácia da segurança portuária como também promoveria uma maior integridade e segurança no intercâmbio de informações marítimas.